Por Tereza Cristina Carvalho1
Estamos vivendo num período de muita turbulência. Mudanças climáticas e transformação digital têm nos trazido novos desafios, que nem sempre estamos preparados para enfrentar. Nossas vulnerabilidades são muitas e vão desde situações emergenciais até a necessidade de criarmos novas formas de trabalho e sustento.
Refletindo sobre as novas formas de trabalho, sabemos que, no Brasil, 76% da população não tem habilidades digitais básicas (segundo censo de 2022 do IBGE) e está totalmente despreparada para essa nova realidade digital. Enfrentam grandes dificuldades para usarem os serviços digitais do governo, do mercado de trabalho, dos bancos, dos supermercados, da área de entretenimento e outros.
Estamos falando de letramento digital, uma habilidade essencial que parte da população brasileira precisa adquirir para acessar os serviços da sociedade moderna. Depois de passar por esse processo de letramento digital, portas se abrem para novas perspectivas. Fica mais fácil procurar emprego e pensar no que é possível fazer para criar novas oportunidades de vida.
Com essa perspectiva, em 2022, foi iniciado o Projeto Jovens Caminhos, desenvolvido pelo Instituto GEA em parceria com LASSU da Escola Politécnica da USP, com financiamento da Petrobrás. O projeto foi implementado em comunidades das cidades Santo André e Mauá, em São Paulo. Santo André tem um IDH igual a 0,835 e é a 5a. maior cidade do estado de São Paulo, com 748 mil habitantes, enquanto Mauá tem um IDH igual a 0,781 e é a 11ª maior cidade do estado, com 418mil habitantes. Foram selecionadas para fazer parte deste projeto comunidades com maior vulnerabilidade social em termos de renda per capita e taxa de analfabetismo.
O projeto teve duas vertentes: uma de letramento digital e outra de arte urbana, ambas com o objetivo de promover a inclusão social e criar novos caminhos para geração de renda. Para ambas as vertentes foram também oferecidos cursos de Cidadania e Sustentabilidade e Orientação de Carreiras.
No caso da vertente de letramento digital, foram oferecidos cursos de 72 horas sobre informática e programação web básica para quatro turmas, totalizando 94 alunos. É interessante observar que 57,4% eram meninas, uma proporção incomum em cursos de tecnologia, geralmente dominados por público masculino. Na vertente de arte urbana, foram oferecidos cursos de 32 horas sobre pintura urbana (grafite) e decoração/pintura de camisetas para oito turmas totalizando 100 alunos, sendo 64% meninos.
Como resultado do programa de letramento digital, cerca de 20% dos alunos interessaram-se pelo Programa Paideia – Pró-profissão em TI – Python, oferecido pela USP, para dar continuidade aos estudos sobre tecnologias digitais. Outros alunos do programa optaram por ingressar em outros cursos, incluindo de nível superior, para consolidar a formação em Tecnologias Digitais e ingressar no mercado de trabalho como profissional de programação computacional.
Na vertente de arte urbana, os alunos participaram de aulas práticas de pintura de grafite em áreas externas das comunidades onde residiam, em Santo André e Mauá. Alguns alunos foram convidados para executar trabalhos em outros locais. Um destaque foi o painel que os alunos pintaram na própria Cidade Universitária da USP (campus principal), com a participação de professores do programa e quatro alunos (vejam as fotos).
Os resultados deste projeto evidenciam o potencial dos jovens para se tornarem protagonistas de suas vidas e construírem novas perspectivas por meio do estudo e do aprendizado de habilidades valorizadas no mercado. É essencial criar oportunidades com engajamento efetivo desses jovens, para que eles possam assumir esse potencial e receber suporte inicial nessa nova jornada, abrindo horizontes de crescimento e realização profissional e pessoal. Essa é a materialização prática dos princípios de ESG (Environmental, Social and Governance).
- Tereza Cristina Carvalho é Professora Associada da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (EPUSP) e Coordenadora do LASSU-PCS-EPUSP. ↩︎